Saturday, August 12, 2006

Bailarina

Ela, ela à muito sonhava… e a dança era o seu sonho. Desde de pequenina, os bailes, os palcos, as sapatilhas, o par… a nada disto acedia, também nem nada lhe era cedido, e por isso chorava, e chorava, e chorava mais uma vez, mas sempre escondida, sempre...
Era uma menina que andava descalça pelas ruas, o vestido era negro e longo e com o qual escondia os pés, com medo de transmitir a sua pobreza. Os olhos eram negros e grandes, mas quase sempre escondidos com a cabeça baixa, o seu olhar era tão triste e tão forte... Os cabelos eram também longos e cuidados, porém irradiavam luz, irradiavam vida! E nada disso a menina tinha… nada tinha.
Em momentos de alegria saltitava entre as pedras da fonte como se tivesse a dançar, como se fosse morrer no próximo minuto. Rodopiava entre olhares à lua, esta sorria-lhe recíproca e ternamente sabendo da felicidade momentânea da menina.
- Anda p’ra casa! Não ouviste? P’ra casa já!
O seu sorriso desapareceu tal como a sua felicidade. Tinha de adormecer depressa, pois a noite já ia longa e o sol iria nascer em breve. Tinha de mais uma vez trabalhar de sol a sol para merecer o tecto e a comida, como lhe repetiam todos os dias. À chegada do sono uma lágrima.
-Adeus minha querida – dizia à lua cheia – espero ver novamente o teu sorriso reconfortante, adeus.
Logo de manhã cedo uma visita, ninguém esperava, nem muito menos que fosse para ela. Um homem alto de chapéu, talvez um homem de negócios, mas o que lhe queria a ela? Ela nunca recebia visitas, a família havia morrido e não tinha amigos, era pobre.
- Bom dia, menina! – cumprimentou-a delicadamente – vai-me desculpar, mas à ontem noite passei pela fonte – a cara dela empalideceu – vi-a dançar, sei que não me viu. Mas sabe? Dança deveras graciosamente…
Ela corou, ao mesmo tempo de vergonha e de orgulho. Algo caiu no chão…
- Não chore, não quero que chore. Quero apenas que sorria. Sei que gostava de dançar… Talvez, se me deixar a possa ajudar, possa um dia ser bailarina.
-Bailarina? A sério? Como? Não pode ser… – caiu no chão e chorou, nada do que estava a acontecer podia ser verdade, só podia estar a sonhar. Sim, um sonho, um sonho mau…
-Por favor deixe-me tira-la deste sítio - limpa-lhe as lágrimas e sorri.
Ela levanta-se sob a mão dele e sorri também.



-Meu senhor, como alguma vez lhe poderei agradecer? Esta é a minha estreia!!
-Use apenas estas bailarinas, fico muito feliz se as usar. Não terá mais de agradecer – tomou-lhe as mãos e sorriu - boa sorte!
-Vou já calça-las!
- Sabe? Adoro o seu sorriso de menina… Não precisa de ter vergonha. Com um sorriso tão lindo é pecado escondê-lo.
- Gentileza sua…

Do palco via-se a lua, tão brilhante como ela nunca vira, e ela tão feliz. Agora não precisava de se esconder…
E a música começou… os passos fluíram, os saltos surgiram… e a lua desapareceu, como? As bailarinas escorregaram no fim dum salto.
Começou então a ver lágrimas a caírem do rosto do homem que apenas vira sorrir, queria-lhe limpar as lágrimas, queria-lhe acariciar a cara com as mãos outrora sujas e ásperas, mas estava cada vez mais longe… e ele cada vez mais perto.

Lua, agora ela brilhava e reconfortava com distantes sorrisos quem amava.